No Ceará, 58 estações ferroviárias antigas aguardam tombamento
A estação de Juazeiro do Norte esteve abandonada nos últimos seis anos e se tornou alvo de ocupação irregular. - Foto: Honório Barbosa |
São 32 terminais e 26 anexos que receberam a proteção de bens valorados, por possuírem característica histórica, artística e cultural, mas nenhum foi tombado pelo Instituto do Patrimônio, Histórico e Artístico Nacional (Iphan) A rede ferroviária que começou a funcionar em Fortaleza, na segunda metade do século XIX, e partiu rumo ao interior nas vias Sul e Norte levou o progresso, facilitou a comunicação, encurtou distância, transportou gente, animais, mercadorias com rapidez e deixou marcas no sertão: memórias que se preservam entre os moradores e as antigas estações de trem. Mesmo assim, no Ceará, não há nenhuma estação ferroviária tombada pelo Instituto do Patrimônio, Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Há 32 terminais e 26 anexos que receberam a proteção ao ser reconhecidos como "Bens Valorados", por possuírem características histórica, artística e cultural. O esperado tombamento, no entanto, nunca ocorreu. A maioria das edificações foi cedida às prefeituras que ocuparam os imóveis com bibliotecas, museus, espaços culturais e sedes de secretarias. Algumas estão abandonadas e outras aguardam projetos de reforma e de instalação de equipamentos culturais.
Em todo o Estado, Fortaleza tem o maior número de estações ferroviárias "valoradas" pelo Iphan. São 11. Em direção ao sul do Estado, cuja ferrovia está desativada desde 2013, há unidades com esse status de proteção: em Redenção, Guaiuba, Baturité, Itapiúna, Aracoiaba, Capistrano, Quixadá, Quixeramobim, Senador Pompeu, Piquet Carneiro, Acopiara, Iguatu (Suassurana), Lavras da Mangabeira, Aurora, Missão Velha e Barbalha.
No antigo ramal, seguindo em direção a Camocim, estão valoradas as estações de Sobral, Senador Sá, Massapê, Uruoca, Martinópole e Granja. Já na linha Norte, ainda ativada para trem de carga, a relação do Iphan inclui antigos terminais em Tururu, Cariré, Ipueiras, Nova Russas e Crateús.
O arquiteto e urbanista Paulo César Barreto observa que as estações ferroviárias e as construções das pontes guardam o avanço da época da engenharia e domínio da tecnologia do aço.
"Os vãos sobre os rios foram feitos por engenheiros ingleses e os terminais têm traços marcantes do início do século XX. Algumas são bem bonitas, arrojadas, e precisam ser preservadas", pontua. "São verdadeiras obras de arte e nas cidades são bem localizadas".
Tombamento
Em nota, o Iphan informa que a Lei 11.483, de 31 de maio de 2007, atribuiu ao Instituto a responsabilidade de receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico e cultural oriundos da extinta Rede Ferroviária Federal S/A (Rffsa), bem como zelar por sua guarda e manutenção. "Os bens operacionais continuam sob responsabilidade do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), que atua em parceria com o Iphan visando a preservação desses bens. Já os bens não operacionais são transferidos ao Instituto. Desses, há casos em que a gestão permanece com o Iphan e, em outros casos, é cedida a entes municipais e estaduais, que dão o uso público e a manutenção dos equipamentos".
A nota ressalta que, no Ceará, não há nenhuma estação ferroviária tombada pelo Iphan. "Há, contudo, 58 bens valorados enquanto Patrimônio Ferroviário, ou seja, que possuem valor histórico, artístico e cultural nos termos da Lei nº 11.483/07 e da Portaria Iphan nº 407/2010".
A maioria desses bens valorados no Ceará, sob a responsabilidade do Iphan, foi cedida às prefeituras locais, que fazem o uso cultural ou institucional e que assumem a conservação e manutenção dos mesmos. "Alguns permanecem com o Iphan, como a Estação João Felipe, que está sendo restaurada e onde funcionará a sede da Superintendência do Iphan no Ceará", encerra a nota.
Estações
No Estado, há terminais que já representam ponto turístico na cidade. É o caso de Baturité, onde a estação foi inaugurada em 1882 e, até hoje, atrai visitantes com seu Museu da Ferrovia. Em Guaiuba (1879) a Câmara Municipal também funciona em uma antiga estação de trem. Em Quixadá, o terminal que fica na localidade de Junco está sem uso. Na sede do município, o prédio de 1891 encontra-se fechado.
Em Juatama, a antiga estação de Quixeramobim, abriga uma brinquedoteca e o Conselho Tutelar. A de Uruquê foi desfigurada após ser adquirida por particular e transformada em residência.
A unidade de Senador Pompeu, inaugurada em 1990, é a atual sede da Fundação Santa Terezinha, entidade que promove ações culturais para os jovens do município.
Centro-Sul
Já na região Centro-Sul, a Estação de Acopiara está abandonada há vários anos. O antigo cartão-postal do município se transformou em um prédio em ruínas, apesar de constar na lista do Iphan. Já na cidade de Iguatu, o pequeno terminal de Suassurana permanece de pé e a antiga estação da cidade inaugurada em 1910 (dois galpões) tem cessão de uso. O município utiliza o espaço como atrativo para shows nas festas natalinas. Nos outros meses, o local fica fechado.
Há situações ainda mais graves. As antigas estações do distrito de José de Alencar e Jaguaribe-Mirim e da cidade de Cariús foram demolidas. Um bom exemplo, porém, pode ser conferido na estação centenária de Cedro que foi transformada em museu. O prédio foi restaurado e reinaugurado em 2016.
Região Norte
A Estação de trem de Sobral ainda pertence à Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN) que é utilizada como unidade de apoio para os ferroviários. A de Granja continua sem uso e, em Ipu, a estação pertence ao município e lá funcionam a biblioteca e um museu.
O conjunto de edificações ferroviárias em Crateús é protegido pelo Iphan como bem valorado. As unidades ainda pertencem à CFN e são utilizadas para serviços de carga e descarga e apoio aos ferroviários. Já a estação de Camocim é um patrimônio histórico municipal, mas não está relacionado como um bem valorado pelo Iphan. O terminal é a sede da Secretaria de Educação.
Cariri
Na região do Cariri, cinco municípios mantêm de pé os prédios das antigas estações de trem: Aurora, Barbalha, Crato, Juazeiro do Norte e Missão Velha. A maioria virou equipamento cultural. Na cidade fundada pelo Padre Cícero, há um projeto ainda mais audacioso que prevê a criação do Museu do Trem. A obra de recuperação do prédio deve ser iniciada no primeiro semestre de 2020.
Inaugurada em 1926, ainda na gestão do Padre Cícero, a estação de Juazeiro do Norte esteve abandonada nos últimos seis anos e se tornou alvo de ocupação irregular. Em maio do ano passado, o prédio foi retomado pela Secretaria de Cultura do Município. O projeto é torná-lo um espaço de exposição permanente, contando a história da estrada de ferro no Cariri e outro para exposições temporárias. Um terceiro funcionará como cafeteria. A Pasta também vai solicitar, junto ao Metrofor a doação de um dos vagões para anexar ao prédio.
O secretário de Cultura de Juazeiro do Norte, Renato Fernandes, informa que a verba para as obras será adquirida através de uma permuta com uma instituição privada de ensino. "O investimento será de aproximadamente R$ 500 mil", adianta Fernandes.
Em Crato, o largo da Rffsa, onde está a antiga estação, também passará por reforma. Lá, funciona o Centro Cultural Araripe, um auditório e uma galeria para exposições. A antiga Casa do Maquinista sedia a Secretaria de Cultura do Município. Segundo o secretário de Infraestrutura, Carlos Paiva, os prédios serão recuperados, assim como a pintura e iluminação, que receberão lâmpadas de LED.
Em Barbalha, o prédio da antiga estação, que foi inaugurado em 1940, está sendo utilizado como terminal rodoviário para ônibus intermunicipais e interestaduais. O edifício é tombado por Lei Municipal e pertence à Prefeitura.
Em Missão Velha a estação esteve fechada até 2011, quando foi reaberta para sediar a Secretaria de Cultura e a Biblioteca Municipal.
Aurora é outro município que usa o prédio da antiga estação como espaço para acomodar a Biblioteca Pública. No anexo funciona a Escola de Música Esmerindo Cabrinha. No distrito de Ingazeiras, a estação, construída em 1922, está de pé, mas sem atividade. *Por Honório Barbosa/Diário do Nordeste