Consumo de chocolate contribui com bem-estar de pacientes idosos com câncer em cuidados paliativos, diz USP
Estudo da Faculdade de Medicina em Ribeirão Preto sugere benefícios e possibilita novas estratégias de tratamento. Alimento foi considerado para pesquisa por ser nutritivo e de fácil aceitação.
Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto (SP) sugere que o chocolate pode estar relacionado a uma melhora significativa no estado nutricional de pacientes idosos com câncer em cuidados paliativos, além de contribuir com a diminuição de sintomas como dor e náusea e reduzir a produção de uma substância relacionada ao estresse oxidativo (condição biológica que gera dano ao material genético).
A notícia é animadora, principalmente para a área de cuidados paliativos, porque mostra novas estratégias que podem ser utilizadas no tratamento.
"Mostra que a gente tem muito o que fazer nos cuidados paliativos. A gente consegue identificar e se inspirar no fato de que nós temos, através dos alimentos, muitas estratégias para cuidar do nosso paciente e da família dele", explica a nutricionista Josiane Cheli Vettori, uma das autoras do estudo, publicado no BMC Palliative Care.
Segundo Josiane, a pesquisa mostra também a importância de se levar em consideração as preferências alimentares do paciente, trazendo conforto e bem-estar.
"A gente pode trabalhar com chocolate e com outros alimentos buscando nutrir o paciente, não somente fisicamente, mas o coração, aquilo que traz memórias, que resgata lembranças, que resgata preferências, que devolve autonomia".
Ainda segundo a pesquisadora, o profissional de saúde, nesse cenário, precisa ter sensibilidade e criatividade de utilizar os alimentos disponíveis e envolvê-los na terapêutica do paciente.
"Muitas vezes, o que acontece é 'ele está muito doente, não pode comer mais nada'. A doença é uma parte do que está acontecendo, mas a pessoa é muito além daquela doença. A pesquisa vem mostrar isso".
O que diz o estudo
O estudo foi realizado com 46 pacientes idosos com diferentes tipos de câncer em cuidados paliativos em tratamento no Serviço de Oncologia e Cuidados Paliativos do Hospital das Clínicas da FMRP, com idade média de 67 anos. Dentre os voluntários, 43,5% estavam em risco de desnutrição ou desnutridos.
Foram formados três grupos: um com pessoas que consumiram 25 gramas diárias de chocolate 55% cacau; um com pessoas que consumiram 25 gramas diárias de chocolate branco; e um que não recebeu nenhum tipo de interferência na dieta.
"O paciente continuou consumindo o que estava na rotina dele, continuou se alimentando normalmente sem nenhum tipo de orientação com relação ao consumo de chocolate ou qualquer outro alimento. Ele ficava livre de se alimentar como sempre se alimentou", ressalta a pesquisadora.
Estudo foi realizado no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, SP — Foto: Reprodução/EPTV |
Por quatro semanas, os voluntários dos primeiros dois grupos, recebiam, diariamente, cinco quadradinhos de chocolate para consumir ao longo do dia.
Pacientes que comeram chocolate 55% cacau tiveram melhora significativa no estado nutricional. "Tanto é, que nenhum deles, ao final da pesquisa, estava desnutrido".
Outro resultado interessante dentro deste grupo é que os pacientes tiveram melhora de qualidade de vida.
"Principalmente com relação a parâmetros de funcionalidade e diminuição de sintomas. Isso é muito importante, porque os sintomas são muito debilitantes e muito frequentes, de dor, de náuseas. E diminuíram significativamente", avalia Josiane.
Pesquisa da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (SP) apontou diminuição de substância relacionada ao estresse oxidativo em pacientes que consumiram chocolate branco — Foto: Reprodução/EPTV |
No grupo dos pacientes que receberam chocolate branco, houve diminuição de uma substância relacionada ao estresse oxidativo, que gera danos nas células.
"É algo que o câncer, a progressão da doença oncológica, gera muito desse estresse oxidativo, porque ele gera muito dano ao material genético. E a gente conseguiu avaliar que nesses pacientes houve a diminuição de uma substância que está relacionada com o aumento do estresse oxidativo".
Preferência nacional
A escolha do chocolate para a pesquisa se deu, justamente, por ser o alimento de maior aceitação entre as pessoas, além de extremamente nutritivo.
O consumo de chocolate é alto no Brasil. Uma pesquisa do Instituto Kantar encomendada pela Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab), por exemplo, aponta que mais de 1,1 bilhão de unidades foram consumidas somente dentro dos lares em 2021, crescimento de 27% comparado ao mesmo período de 2020.
"O chocolate tem uma série de funcionalidades, principalmente atribuídas a uma substância que chama polifenois. É associado a diversos benefícios, como diminuição de doenças cardiovasculares, regulação de pressão arterial, melhora do humor", conta a nutricionista.
Josiane aponta que vários estudos mostram os efeitos benéficos do consumo de chocolate, mas, nessa população específica, não havia informação suficiente.
"Essa população de pacientes com câncer, que já estão debilitados e em cuidado paliativo, sofrendo um processo de deterioração do estado nutricional, não existia na literatura. A gente pensou em trabalhar com esses pacientes para oferecer, realmente, possibilidades e ver o quanto isso pode ser ou não significativo para eles".
Ainda segundo Josiane, pensar em uma estratégia nutricional que, além de fornecer nutrientes para o corpo, pudesse contribuir para melhora da qualidade de vida e o bem-estar desses pacientes foi o caminho mais óbvio para chegar ao chocolate.
"É um alimento saboroso, palatável, tem características organolépticas que lhe são muito favoráveis ao consumo, o paciente tem fácil acesso, é fácil de encontrar".
Incidência de câncer no Brasil
De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o câncer é a segunda principal causa de morte no mundo. Em nível global, uma em cada seis mortes estão relacionadas à doença.
Dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA) apontam que, para o Brasil, a estimativa para cada ano do triênio 2020-2022 é de que ocorrerão 625 mil casos novos de câncer (450 mil, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma).
O câncer de pele não melanoma será o mais incidente (177 mil), seguido pelos cânceres de mama e próstata (66 mil cada), cólon e reto (41 mil), pulmão (30 mil) e estômago (21 mil).
Segundo o INCA, os tipos de câncer mais frequentes em homens, à exceção do câncer de pele não melanoma, serão próstata (29,2%), cólon e reto (9,1%), pulmão (7,9%), estômago (5,9%) e cavidade oral (5,0%).
Nas mulheres, exceto o câncer de pele não melanoma, os cânceres de mama (29,7%), cólon e reto (9,2%), colo do útero (7,5%), pulmão (5,6%) e tireoide (5,4%) figurarão entre os principais.
Ainda segundo o instituto, o câncer de pele não melanoma representará 27,1% de todos os casos de câncer em homens e 29,5% em mulheres.
Por g1 Ribeirão Preto e Franca