Assaí sobe com mega-oferta de até R$ 3,65 bi e promessa de melhor governança
Assaí: ação sobe após anúncio de venda de ações de até R$ 3,65 bilhões pelo grupo francês Casino (Assaí/Divulgação) |
Quando o controlador vende em mega-oferta e mercado vê como boa notícia.
O Assaí (ASAI3) anuncia uma mega oferta de ações de até R$ 3,65 bilhões e, mesmo assim, em um mercado para lá de volátil e sensível, a ação nada sofre. Ao contrário, marca leve alta de 0,57%, ao término do pregão. Para completar o quadro: será uma ‘fast oferta’. O preço será definido amanhã, no fim do dia. Demanda não falta, como indicam as cotações. Aliás, no fim da manhã de hoje, dia 28, mal o mercado soube da transação, já havia cobertura para tudo.
A oferta base é de quase 10,5% do capital total (140,8 milhões de ações), podendo chegar a 14,1% se todo lote adicional for colocado (190,3 milhões de papéis) — um extra de 35%, que só é colocado de acordo com o equilíbrio entre preço e demanda. Não haverá dinheiro novo para o negócio, para o caisa do Assaí.
Quem vai vender os papéis é o grupo francês Casino, que com uma fatia de pouco menos de 40% atua como controlador minoritário. Após a operação, essa participação deve cair para algo entre 29% e 34%, considerando dados do formulário de referência da companhia. Em volume financeiro, é uma transação de R$ 2,7 bilhões, mas que podem subir até R$ 3,65 bilhões, considerando o preço de sexta-feira, dia 25.
Mas o que tem de bom, então, que os investidores gostaram de ver o acionista principal reduzir sua fatia? Há uma máxima antiga no mercado de que quando o “insider” é vendedor o sinal é ruim. Mas, pelo visto, ela não se aplica a esse caso.
Primeiramente, no caso do Assaí, o mercado tem clareza de que a venda do Casino tem relação única e exclusivamente com a situação financeira do grupo controlador, que segue muito alavancado e precisa de recursos — o máximo que der — para melhorar sua solidez. Precisa de dinheiro e rápido: tenta evitar o vencimento antecipado de alguns compromissos.
Em segundo lugar, a venda fará a participação da empresa comandada por Jean Charles Naouri reduzir sua concentração no Assaí. A administração do da companhia falou com analistas do “sell side” (de corretoras) sobre a novidade e disse tudo que os investidores mais queriam ouvir.
Foi dito — não dessa forma, exatamente — que este pode ser mesmo “o começo do fim” da era Casino no Assaí e que as vendas devem abrir espaço para melhorias na governança da companhia já no curto prazo. Ou seja, depois dessa venda, a expectativa é que novas aconteçam.
Hoje, os franceses indicam cinco membros de um conselho de administração formado por nove membros — têm papel de controlador, de fato, portanto. Ocorre que, todos os anos, desde que foi feita a cisão do Assaí de dentro do Grupo Pão de Açúcar (PCAR3), há uma queixa recorrente: o pacote de remuneração dos administradores, com ênfase para os conselheiros, que são, em grande parte, executivos franceses do Casino.
Para 2022, a remuneração global aprovada para os administradores do Assaí foi de R$ 72,3 milhões — e não custa lembrar as polêmicas envolvendo um pacote de R$ 35 milhões proposto pela Eletrobras, no pós-privatização. Desse total, algo bastante incomum na divisão dos valores: quase metade, R$ 35,1 milhões, fica com o conselho de administração. Só para mais uma comparação inusitada: na Eletrobras, dos R$ 35 milhões, pouco mais de R$ 30 milhões devem ser pagos aos executivos.
Extremos à parte, a visão é de que, no fim das contas, a posição no conselho de Assaí, que não deveria sequer contar com remuneração adicional ou só algum pagamento mínimo, banca as despesas da matriz. Em outras palavras: conflito de interesses. O modelo é aprovado porque com quase 40%, o Casino prevalece com facilidade na assembleia. Não é de se admirar, portanto, que a diminuição desse poder seja comemorada.
Além disso, a compra das lojas do Extra pode ter sido aplaudida pelo mercado como estratégia, mas não em preço: um acordo de R$ 5,2 bilhões por 71 unidades. Ficou um gostinho amargo de que o negócio saiu caro. E, agora, o Assaí precisa provar que sabia o que estava fazendo.
De fato, Belmiro Gomes, CEO do Assaí, conquistou ainda mais os investidores com seu estilo cheio de cultura, conhecimento das nuances do varejo, e “mão na massa” — tudo ao mesmo tempo — desde que a empresa passou a ser listada separadamente. Ainda que o executivo seja um dos mais discretos do mercado. A operação de atacarejo dentro do GPA já era muito bem-quista, mas a proximidade de Gomes dos investidores trouxe apenas mais confiança em sua execução. E ela está se provando também sobre as lojas adquiridas do Extra.
Mas, em caso de dúvidas, uma nova política com partes relacionadas foi inserida numa mudança recente do estatuto de administração: transações com partes relacionadas acima de R$ 100 milhões deverão ser submetidas à votação de acionistas. Com um Casino mais diluído, é uma bela mudança de postura.
Porém, por mais que governança seja essencial, é para lá de conhecido que o mercado, em especial o brasileiro, gosta mesmo é “dos economics”. E, por essa ótica, a oferta faz sentido, uma vez que vai aumentar a liquidez da ação potencialmente em cerca de 20%. Mais do que isso, no cenário cheio de dúvidas sobre renda do brasileiro e futuro da taxa de juros e da inflação, o mercado de atacarejo é uma posição defensiva, quase essencial. E a execução do Assaí convence os investidores.
Não por acaso, o Goldman Sachs, em relatório aos investidores, resumiu a oferta como um movimento que pode “resultar em uma estrutura acionária mais diversificada, que abre espaço para melhorias na governança da empresa, e aumento na liquidez dos papéis”.
No primeiro dia de negociação na B3, em março de 2021, a ação fechou a R$ 14,07. No pregão de hoje, com todo sobe e desce, mais o mau humor com varejo, encerrou a R$ 19,32, com o Assaí avaliado em mais de R$ 26 bilhões na bolsa.
Reportagem de Graziella Valenti/Agência Exame